segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Liberdade de acção


Ainda não vi o “Filme do Desassossego” , mas a propósito da estreia, ouvi o realizador, João Botelho, dizer que não é possível ver-se o filme a comer pipocas e a beber. Optou por levar o filme para um circuito alternativo onde supostamente estará um público mais receptivo  e mais “respeitador do cinema”, como diz. É uma opção muitíssimo acertada e sensata, porque Botelho acha (e bem), que nas salas comerciais o filme vai ser abafado.
 Eu conto ir a um desses locais alternativos ver o “Filme do Desassossego”, mas não aprecio nada que me digam que tipo de espectadora devo ser. É um  mau princípio sugerir, pretensiosamente, certos requisitos de comportamento para se ver o filme, insinuando que a grande maioria dos espectadores de cinema os desconhece e desrespeita. É uma mensagem errada, de que padece muita criação artística que se faz no país. Até porque me parece difícil que alguém vá ver um filme português, seja qual for, acompanhado de um balde de pipocas. A dicção dos actores e o som, no geral, são tão miseráveis que, não raras vezes, é necessário fazer-se um esforço titânico de audição para se entenderem as falas. Quem se arrisca ainda a trincar pipocas nestas circunstâncias?
Há muitas maneiras de ver e de estar no cinema. Quem entra numa sala para ver o intrigante 'Canino' (Yorgos Lanthimos), ou o especialíssimo 'Lola' (Brillante Mendoza), sabe que o simples facto de se fazer qualquer outra coisa que não seja estar, atentamente, subtrai a dose de presença imprescindível a um bom entendimento com o filme. Há alturas em que é preciso entrar em olhares e silêncios que perduram e nos consomem. Nunca vi nem ouvi pipocas neste cinema.
 Em contrapartida levo sempre um balde delas quando vou ver um James Bond. Se há cinema que pede concentração, há um outro que implora acção! E isso também não pode ser contrariado. Pelo contrário, pode proporcionar até, muitos ensinamentos.
Desconfio que, se os apreciadores, ou espectadores de cinema (ups! disse cinema…) pornográfico tivessem de obedecer a um padrão de comportamento desejável, talvez este nunca se tivesse tornado no estrondoso sucesso de ‘bilheteira’ que é. Também é , apesar dos pesares, uma certa ideia e postura de liberdade, que está aqui em causa. Nomeadamente, liberdade de acção! 

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